sábado, 25 de março de 2006

2006

Quinta-feira, Março 30, 2006


Alguns dos textos que escrevi para o Descubra Curitiba durante o festival... acho que está em ordem cronológica, da primeira quinta até terça-feira, se não me engano. Posso pôr mais depois, se tiver tempo e boa vontade (já que ninguém entra nesse blog mesmo)... 


Um Pouco na Rua, Um Pouco no Palco - (Hygiene) 
Engajamento e entretenimento, interatividade e liberdade. Brancos e amarelos. Hygiene é tão cheia de surpresas e de diversidade que chega a carregar seu público para um longo passeio a céu aberto pelas calçadas do Largo da Ordem, antes mesmos que eles entreguem seu bilhete de entrada e acomodem-se na arquibancada da Casa Vermelha. 
Durante todos os dias do festival, às 16h30, sairão de dentro da Igreja do Rosário (na ¿Praça do Cavalo¿) seis versáteis paulistas que irão caminhar, cantar, conquistar e envolver a todos. Não há como ser diferente: em sessenta minutos de apresentação de rua, os atores se dividem em muitos personagens, ocupam antigas casas do Largo, correm de bicicleta, guiam uma procissão e deixam curiosos aqueles que estavam apenas de passagem e resolveram prestar atenção na multidão.
Mas, se há comédia e leveza nas ruas, o público que entrou na Casa Vermelha pode dizer que também há fado nessa festa. Sim, há fado. Tudo muito mais denso do que o samba e os tambores que antes ecoaram nas ruas. Sim, há fardo também. É o peso quem traz a reflexão. 
Dessa forma oscilante entre risos e lágrimas, Hygiene apresenta os muitos sofrimentos e as pequenas esperanças de moradores de cortiços do Brasil de 1899, o ano em que mais de 600 pessoas foram desabrigadas e mortas para dar espaço à limpeza e higienização, clareando, assim, o país do amarelo podre da doença dos pobres. 
Àqueles que aceitarem o convite gentil do Grupo XIX de Teatro, sigam a pequena ¿Santa¿ Amarela e aproximem-se, cheguem bem perto uns dos outros e aproveitem. Estar junto é a única forma de transformar. 


Mirandolina: na medida 
Assistir a uma estréia no teatro sempre nos enche de benevolência. Acontecem desencontros entre o palco e a coxia, entre o palco e os atores, entre os atores e os atores e há até os desencontros entre atores com eles mesmos. Por isso é a benevolência que nos permite chegar satisfeitos ao fim do espetáculo, aplaudindo sinceramente. 
No único espetáculo curitibano selecionado para a Mostra Oficial do FTC - em cartaz no Guairinha hoje, às 21h - a primorosa direção de Roberto Innocente e a comicidade das cenas nos faz esquecer de alguns pequenos deslizes (tropeções no texto, dificuldade de dicção) ocorridos durante a estréia de Mirandolina. 
Mirandolina é uma moça solteira do século XVIII que tem como arte maior fazer com que todos os homens que a conheçam fiquem apaixonados por ela. Ela, por sua vez, não quer saber de se casar, diverte-se às custas de seus quatro enamorados e assemelha-se mais a uma jovem feminista do século XX do que a qualquer italiana do seu tempo. Porém, o texto clássico e inovador de Carlos Goldoni não faz uma apologia ao feminismo, antes, fala do orgulho, rei eterno e onipotente de tantos relacionamentos espalhados pelo mundo. Uma originalidade para os padrões teatrais da Itália de 300 anos atrás. 
No fim, a peça acerta na medida, mas não arranca adjetivos maiores. Uma boa opção para quem gosta de comédias descomprometidas e ainda assim bem executadas. Destaque para o belo e cuidadoso figurino (em detrimento do simplório cenário), o texto fluido e sonoro e a competente apresentação dos atores, desde o reconhecido Mauro Zanatta ao jovem Fábio Lins. 


Fique com o filme, fique com o livro - (Canto dos Malditos) 
Não. Não é Bicho de Sete Cabeças para o palco. A versão teatral para Canto dos Malditos, livro homônimo do também diretor Austragésimo Carrano, é muito mais fraca em seu objetivo-sina de catequizar o público. 
Dentro de um manicômio qualquer, o espírito de Charcot e Freud baixam sobre dois pacientes que passam os dias a psicoanalisar outros pacientes, que, por sua vez, sentem-se aptos a analisar outros pacientes. Todos estão aptos a rotular. 
Entre o tom quase cômico que algumas vezes arranca risadas da platéia, ao tom panfletário e falso-dramático dos quinze minutos finais, ouvimos a voz de algum anormal dizer: ¿Freud esqueceu de rotular o preconceito como uma doença mental¿ ou ¿a loucura é relativa, parem de me rotular¿ ou ainda frases sofridas que diziam ¿ até quando?¿, ¿alguém pode?¿, ¿por quê?¿. 
A vontade que o pregador Carrano tem de que todos entrem na sua luta contra a moderna psiquiatria, que há anos encarcera pacientes em hospícios desumanos, não conquista nenhum fiel e ainda faz sofrer uma companhia dedicada e cheia de boas intenções. 
Há 500 anos, os jesuítas já sabiam que a melhor forma de arrebanhar não era com palestras ou sermões, mas com parábolas, com histórias e com teatro. Canto dos Malditos, a peça, não passa de um epílogo que explica a moral da história que todos já tinham aprendido em Bicho de Sete Cabeças, e era o bastante. 


Capricho, cuidado e risadas, muitas risadas - (Circo Itinerante) 
O espetáculo de rua é sempre democrático. O bom espetáculo de rua sempre consegue reunir. A beleza paralela à cena está em assistir às feições inusitadas das pessoas que acabaram de sair do trabalho e foram surpreendidas pela alegria presente no meio da praça. Elas param também e em minutos já são parte de tudo aquilo. Esqueceram-se que tinham um lugar para ir, um problema para resolver ou uma cerveja para tomar. 
Ao meu lado, uma franzina menininha. Ela deixou a mãe que não quis se sentar mais a frente, mas voltava os olhos constantemente para verificar se aquela satisfação também havia atingido sua mãe. 
Em poucos momentos somos um. Temos todos a mesma idade e rimos todos das mesmas piadas, aplaudimos os mesmos malabares e os malabarismos, as mesmas acrobacias e acrobatas. 
Equilíbrioé assim na platéia. No palco, o palhaço Fofó da Fofoficina precisa mostrar para Vida, uma das filhas do Senhor Universo, que ela vale a pena. A beleza do mundo, então, é mostrada para ela e de uma boneca carrancuda, vemos brotar uma criança sorridente. Talvez exatamente como muitos de nós. 
Os seis atores em cena, além de suas versáteis habilidades e da aprovação do público, contam também com o apoio constante do diretor e operador de som Andrei Moschetto. Mesmo num cantinho afastado, é o sorriso empolgante e o olhar atento que nós encontramos e conseguimos desvendar qual é o veredito do pai. E ele está sempre lá, presente como o Senhor Universo, impulsionando seus filhos durante o espetáculo, sacudindo a cabeça positivamente e concedendo sua benção, orgulhoso. 
Para os que são fãs de teatro de rua, é inevitável a comparação de Fofó com João Grandão, o palhaço paulistano de Marcio Ballas, que há anos vem ao Festival de Teatro de Curitiba com o popular Planeta Clown. Desmérito algum para Fofó. Uma boa matriz para uma cópia legítima. 
Quanto ao resto da trupe, de longe, podem lembrar os simpáticos palhaços do Cirque du Soleil: são malabaristas, acrobatas e comediantes sem o glamour da companhia canadense, mas falando a mesma língua estranha e sem tradução que todos entendem. Entendem, sorriem e aplaudem. Aplaudem muito 


Encontro insólito em Ponto de Fuga 
¿Duas garrafas de uísque, um pacote de cigarros, uma bandeja de canapés. Duas garrafas de uísque, um pacote de cigarros, uma bandeja de canapés. Duas garrafas de uísque, um pacote de cigarros, uma bandeja de canapés.¿ É com esse lembrete mental repetido em voz alta inúmeros vezes que ele consegue incomodá-la e começar um dialogo sempre incompleto e sempre dúbio. E é com essas brincadeiras pronominais que o texto de Ponto de Fuga se estrutura. 
Duas pessoas que estão em algum lugar estranho e conversam ou esperam para conversar porque ali é o lugar mais perto para os dois. Aos poucos, elas descobrem que podem se desligar das ausências e conhecer um ou outro. 
É preciso paciência para assistir a Ponto de Fuga. Nenhuma ação e um diálogo que retorna sempre ao ponto inicial para poder dar um passo adiante podem cansar o espectador desprevenido e não agradar o mais imaturo. 


O inesperado não acontece em Hércules 
Quem leu o resumo de Hércules no guia do FTC, confiou nele e comprou um ingresso para a peça, não se decepcionará. Também não irá se surpreender. Bonecos gigantes, andaimes, caminhão, fogos de artifício e chuva de papel. Tudo em tamanho extra grande para embasbacar os amantes do circo antigo. Aos amantes da literatura e da mitologia grega sobram releituras banais sobre os doze trabalhos do filho de Zeus num contexto ¿Brasil-na-Era-Lula-Bush-desemprego-e-miséria¿. 
As dimensões anunciadas no guia e pouco vistas em outros espetáculos são o grande trunfo de Hércules. É tudo imenso, tudo ¿ão¿. Há belos momentos em que os mais de 25 atores em cena, com coreografias e encenações, fazem o pobre semi-deus penar. Há os problemas com os sons (que atrapalham o entendimento das falas microfonadas), com as comparações baratas, com a falta de carisma. Apesar de querer fazer crer que todos nós homens mortais ¿ por realizarmos mais que doze trabalhos por dia todos os dias ¿ somos também heróis, Hércules não cativa, não empolga, não prende a atenção. 
A plasticidade da Pia Fraus impressiona em alguns momentos e a comicidade dos Parlapatões só arranca gargalhadas quando eles deixam os seus mitológicos personagens para cair em uma improvisada conversa de amigos. 
Decepção para alguns, beleza para outros e inércia para vários. 


Silêncio e satisfação em Oito 
Silêncio. O público entra e eles já estão lá em silêncio. A peça começa e minutos se passam até que algum som seja ouvido. A platéia permanece imóvel. Logo, presenciamos uma série de corridas e interrupções e falas e silêncios e exitações e continuidades. Eles são Oito, oito atores que vieram da USP para falar da pressa que o mundo tem, do silêncio e do barulho que ele faz, das manias de cada um. 
Oito é aquele tipo de encenação sensível, que surge de um processo de criação coletiva e que comunica sem precisar falar muito. Os fragmentos de pensamento se transformam em pequenas cenas que tratam do inesperado e de situações que até parecem incomuns mas que tem aquela ponta de realidade como em um filme de David Lynch. 
Domínio do corpo, das ações, da técnica teatral. Espaço cênico vazio de adereços ou cenários. Uma luz que preenche o espaço e determina o sentimento de cada instante. No final, um arrepio corre o público quando um dos atores nos convida a cruzar a fronteira e ir até o palco para fazer qualquer coisa. Fazer qualquer coisa e experimentar a passagem de um tempo diferente que só existe nos palcos. Ninguém decide ir e todos nós perdemos a oportunidade de romper nossos limites e experimentar o que aqueles oito estavam vivendo há cinqüenta minutos. Ficamos apenas com a sensação do silêncio, da delicadeza e da satisfação. O bastante para deixar o teatro sinceramente admirados. 


Otelo da Mangueira: surpreedente 
¿Mangueira teu cenário é uma beleza que a natureza criou¿, ¿soberba, garbosa, minha escola é um cata-vento a girar. É verde, é rosa, oh abre alas para a Mangueira passar¿, ¿alvorada lá no morro que beleza...¿ Muitas músicas para um só amor: a Mangueira. O que é só uma escola de samba para muitos curitibanos e outros não-cariocas, é uma paixão, um estilo de vida, um ideal de comunidade, uma bandeira, um estandarte para muitos amantes do samba tradicional e da cultura do morro da Mangueira. Esse amor dedicado à escola de samba é o tema de Otelo da Mangueira. A inveja, a intriga, o ciúmes, a desconfiança, a paixão e a morte também. 
Otelo da Mangueira é um espetáculo no sentido mais puro da palavra. Um cenário simples e belo, bons atores, bons cantores, bons músicos, figurinos muito bem trabalhados e belos, belas músicas, belos textos, bela encanação. São quase duas horas de encher os olhos e os ouvidos. O cuidado com a adaptação da obra de William Shakespeare para um Rio de Janeiro de 60 anos atrás é digna dos vários minutos de aplausos arrancados da platéia no final da peça. Dá tão certo, que vemos um Dirceu mais maldoso, mais astuto e mais sarcástico que o próprio Iago. É um malandro carioca da pior estirpe, sem escrúpulos e que quer acabar com Otelo para poder ser o ¿cidadão-samba¿ do carnaval, quer que o seu samba vá para a avenida, quer acabar com a felicidade de Lucíola (Desdêmona) e com o talento do jovem Candinho. 
A trama mantém a estrutura do original e em nada fica para trás. Como bônus, há o acréscimo dos momentos cômicos especialmente criados para as personagens cariocas, para quem tudo é motivo para um bom samba, uma boa dança, uma boa briga. As músicas que permeiam a encenação são fruto da pesquisa de Gustavo Gasparani sobre os compositores mangueirenses, e são elas que ajudam a narrar momentos como a sensação de morte, misto de saudade e paixão por Otelo, que Lucíola tem e que expressa com a comovente ¿As Rosas Não Falam¿, do compositor Nelson Cavaquinho. 
Simplesmente belo e atual. Só é uma pena que tão poucas pessoas tenham comparecido ao Guairão na estréia. Aos curiosos e aos interessados, para assistir Otelo da Mangueira em Curitiba só mais hoje e amanhã, às 20h30. 


Muito bom, muito inteligente e muito barato - (O Homem que Era uma Fábrica) 
Comédia da melhor qualidade. Críticas sarcásticas. Peça vibrante e incansável. E a satisfação de presenciar tudo isso em um domingo de manhã. 
O homem que era uma fábrica é Bonifácio da Silva. Ele está desempregado e resolve ir para os Estados Unidos. No consulado, após entregar os exames de saúde, um médico descobre que Mister da Silva tem o melhor e mais puro produto fecal que um brasileiro já produziu. Bonifácio, então, vira o ¿homem do cocô da televisão¿. Todos o admiram por ser um exemplo para a nação. 
A fábrica é ele mesmo. Sem dinheiro para nada, Da Silva e seu amigo começam a vender o excremento para os candidatos a entrar nos EUA. Tudo vai bem até que o consulado descobre que tudo o que está nos laboratórios ¿é a mesma m.¿. 
Descrevendo assim, pode parecer escatológico. Mas, não, não é. Nada de ofensas, nada de mau gosto, o texto de Augusto Boal é muito inteligente e atual quando critica o Brasil e os brasileiros, a América e os americanos e o sonho latino de enriquecer a qualquer custo. As inserções de temas retirados do jornal de hoje ¿ técnica que Augusto Boal chamava de teatro-jornal ¿ faz com que a peça esteja fresca a cada dia. A montagem da companhia paulista Arthur-Arnaldo é brilhante, moderna e ritmada. Enfim uma peça que critica com humor e inteligência, em um cenário enxuto e funcional, com atores perfeitos para uma encenação de alto-risco que não deixa nada a desejar. 
O Homem que Era uma Fábrica fez apenas duas apresentações no Solar do Barão. Os ingressos para estudantes custavam só R$3,00 e o prazer de assistir a um ¿achado¿ como esse dificilmente poderia ser comprado. 


Sem surpresas em Metamorphosis 
Indicado a seis prêmios Gralha Azul, que esse ano será entregue durante o Festival de Teatro, Metamorphosis é uma adaptação do texto clássico de Franz Kafka, em que um caixeiro-viajante, Gregor Samsa, acorda metamorfoseado em um inseto repugnante. 
O que se vê de especial nessa montagem do diretor Edson Bueno é a interpretação quase silenciosa do ator Elder Gattely, no papel de Gregor, que sem qualquer artifício externo, transforma seu corpo humano em um corpo de inseto no qual vemos várias patas, olhos arregalados, andar turvo e a sensação de desconforto. 
A diferença no conteúdo do livro para o conteúdo da peça está no viés clownesco que pai, mãe e inseto adquirem em Metamorphosis e na rigidez acentuada com que todos tratam Gregor desde o primeiro instante. Dois personagens narradores se tornam os hóspedes dos Samsa e o chefe de Gregor. A casa é protegida por telas e arame farpado e se transforma na fortaleza em que a família se escondeu depois da transformação do filho mais velho. 
É bom para quem conhece o texto, bom para quem quer conhecer e bom para ver uma boa peça local, que surpreende pouco e não desagrada. 


A memória é uma ilha de edição - (Capitu ¿ Memória Editada) 
O desafio de Capitu ¿ Memória Editada é apresentar um texto conhecido por todos, que quase chega a ser um mito sobre o ciúmes, a partir de diversos pontos de vista possíveis da história. Então, o que logo entendemos é que a peça irá nos mostrar algumas lembranças e pensamentos de Capitu, pensamentos de Dona Gloria, pensamentos de Bentinho novo e de Bentinho mais velho. Pensamentos que se cortam, falas que quebram a lógica convencional. 
A peça acredita que ¿a memória é uma ilha de edição¿, como disse Glauber Rocha e Wally Salomão eternizou em uma música dO Rappa, e que por isso o que está escrito em Dom Casmurro é apenas uma das lembranças sobre o que realmente aconteceu com um dos casais mais conhecidos de Machado de Assis. Essa lembrança, pra piorar, é ainda de uma pessoa que conta uma história muitos anos depois, e que está cheia de rancores, de esquecimentos, de parcialidades. Por isso, em Capitu, outros personagens também têm sua vez de contar um pouco de seus pensamentos e memórias. 
Assim como no original machadiano, aqui nada é resolvido ou clareado. As dúvidas continuam e aumentam, mas outras questões também são suscitadas e os mistérios da memória são discutidos de uma forma descontraída e inteligente. 
Indicado para o Gralha Azul de melhor espetáculo, ator, ator coadjuvante, direção e melhor texto. Destaque ainda para a iluminação pontual e marcante, para o cenário que ganha quadros novos no decorrer da história, para a agilidade da encenação e para as quebras que dividem o texto em capítulos, que são nomeados como em Dom Casmurro. 


Três monólogos em uma peça - (Rastro de Luz) 
Uma das últimas falas de Frank Constantin, em Rastro de Luz ¿ Molly Sweeney é sobre o dia em que ele e seu amigo Dick foram a um lugar escondido para pescar e lá encontraram uma toca de texugos. Cavaram, cavaram, cavaram e retiraram o casal de texugos de lá. Depois, fizeram força para levá-los ao topo de um morro onde tinha uma toca, segundo Frank e Dick, muito melhor para eles viverem. Quando estavam no topo, os texugos, que tem pouca visão, arrebentaram as amarras e voltaram em desespero para a antiga toca que ficava perto da água e onde eles poderiam viver longe de outros olhares. 
Molly Sweeney é um desses texugos cegos. Convencida pelo marido, interessado pelas bizarrices do mundo, a realizar uma cirurgia que poderia fazê-la voltar a enxergar, Molly vai ao encontro do Dr. Peter Rice, um médico que vê no sucesso da operação a possibilidade de conseguir fama e reconhecimento. 
Contada em forma de depoimentos, a peça é valiosa graças ao texto do irlandês Brian Friel, que tenta esmiuçar o ponto de vista de cada um dos personagens sobre um mesmo momento da vida deles. Assim, a partir do que cada um deles contam, é que vemos revelada a personalidade ferida do Dr. Rice, a forteleza destruída em que Molly se transforma, e a fonte de conhecimento inútil que Frank é. 
Em determinado momento, Rastro de Luz proporciona ao público uma experiência interessante ao fazer com que todos nós voltemos a enxergar. Interessante também é a interpretação de Julia Lemmertz, que tem um ponto dramático ideal para a representação dessa mulher segura, que não precisava enxergar, mas que faz isso para suprir a expectativa das pessoas a sua volta. Interessante a construção de três monólogos em uma única peça, apesar de, em certo ponto, isso nos fazer questionar sobre a fé da companhia no teatro e nas possibilidades que ele dá (pensamento que não é original meu, mas que também me fez pensar). 
Um pouco longa, um tanto prolixa, Rastro de Luz é valiosa por nos questionar sobre a validade das ¿boas ações¿, ela nos leva a pensar sobre se realmente todos temos as mesmas necessidades, se querer que o outro tenha tudo que nós temos é algo bom, importante, altruísta. A resposta que encontramos em Molly Sweety é não: o texugos cego arranca as amarras e retorna desesperado para sua toca escura e molhada e lá vive feliz, ao seu jeito.
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Segunda-feira, Março 27, 2006


25 de março de 2006, Wonka. 
"Cara, esse é o melhor aniversário da minha vida!" 

 

- para a Comentadora Maluca e aqueles amigos malucos também que passaram lá!
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Sexta-feira, Março 24, 2006


Estou sofrendo de um mal, silenciosamente. Estou mais sozinha do que nunca na vida e não consigo pedir pra ninguém falar comigo. Meu Deus, estou com dó de mim mesma. Entre ser eu mesma e ser eu com mais alguém, algo se perdeu. Não consigo me imaginar como há um ano ou dois e tenho medo de ter o mesmo fim dela. Meu mal é desejar desesperadamente. Meu mal é ter certeza que alguma semente de desafeto cresceu em duas semanas. Eu não quero ouvir a verdade se ela não for boa, mas não posso mais viver desse jeitinho sofrido. Tenho vontade de ser extremamente especial. Meu Deus, como estou sozinha agora. Meu Deus, como eu queria mudar a minha vida. É meu aniversário e uma tristeza gigante se alojou aqui. Idealizações nunca me levaram a lugar algum. Antes melhor se choramingar aqui me tornassem uma grande mulher... inferno astral sem fim! 
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Segunda-feira, Março 20, 2006


Ok, então, não tenho escrito mais com muita frequencia, mas tenho uma notícia: 
www.descubracuritiba.com.br 
Festival de teatro está aí e o povo desse site resolveu me deixar escrever coisas que eu penso lá. Massa! 
entrem no site pra ter informações sobre o festival e encontrar alguns textos meus... he! que orgulho! 
olha: 

 

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Domingo, Março 12, 2006


aquilo que há tanto não me contagiava, voltou. é domingo. é domingo a noite. o antigo e conhecido de todos nós: o nó. o nó e seu amigo medo. o senhor medo é tão quieto. tão opaco. ele chega e não fala nada. deixa seu amigo nó começar a enrolar-se por entre a tripas, as veias, os nervos. ah, os nervos. esses já chegaram à pele, à flor dela. e a ansiedade pela segunda. fazia tempo que eu me sentia livre dela. manter-me ocupada até as onze da noite aliviava todos esses pequenos demônios e me permitia chegar e dormir. agora choro. temo o senhor há de vir. e a senhora noite. temo. temo estar só. quando? me pergunto, quando vou ter alguém mais que o cão ao meu lado? quero a companhia difícil. quero a alegria difícil. quero a realidade difícil. porque eu temo todas as coisas reais. porque eu temo meus próximos momentos. temo perder o pouco que tenho. e temo ter mais. preciso parar de fazer listas e escrever algo para você se divertir. afinal, eu sou uma piada.
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Sexta-feira, Março 10, 2006


 
III PUTZ - festival universitário de cinema e vídeo de Curitiba 
www.putz.ufpr.br --------- link -------------------> 
entrem, conheçam, divulguem e participem! 

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Quinta-feira, Março 02, 2006


Pessoas normais são agridoces, são inconstantes. Desinteressantemente inconstantes. De um inconstante preterido, deferido, conhecido. Inconstantemente previsíveis. Pessoas normais suam, fedem. Pessoas normais desejam não desejar, desejam passar incólume, desejam anonimato e autonomia. Pessoas normais não sabem lidar com a normalidade, mas tem soluções extraordinárias para situações extraordinárias. Elas são chatas, enfadonhas, fáceis, macias. São mamão com açúcar, são meio moles meio duras. Pessoas normais começam a fazer algo e não chegam ao fim. Ou não têm força ou não tem vontade ou desistem mesmo. Pessoas normais choram sem razão, reclamam sem razão, desejam sem razão, amam sem razão. Pessoas normais não são isso só. Pessoas normais são insípidas, incolores, inodoras. Desinteressantemente inconstantes.